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Destaques da sessão da TNU de 10 e 11/05

publicado 26/05/2010 16h10, última modificação 07/10/2016 19h25

Na última sessão da Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais (TNUJEF’s), realizada nos dias 10 e 11 de maio de 2010, na sede do Tribunal Regional Federal da 2ª Região, no Rio de Janeiro/RJ, várias questões foram submetidas a julgamento, tendo sido firmadas, dentre outras, as seguintes teses:

I. Precedentes da TNUJEF’s e do STJ oriundos de recursos que não foram conhecidos. Paradigmas. Possibilidade. Existência de tese firmada, mesmo não sendo conhecidos os respectivos recursos.

No julgamento do Processo nº 2008.70.50.01.1324-6, o relator, juiz federal RONIVON DE ARAGÃO, afirmou que “o não conhecimento, a par de impedir o exame de mérito, consiste em assinalar que a Corte não tomara conhecimento das razões invocadas. Se não tomara conhecimento das razões invocadas, é porque não foi firmada a tese jurídica. O fato de, em alguns desses julgamentos, constar na ementa da decisão (ou mesmo na fundamentação do voto condutor) referência a eventual tese, não significa que tal tenha ocorrido. Nessas circunstâncias, trata-se de costume das Cortes que, mesmo não conhecendo do recurso, estabelecem premissas jurídicas referentes àquele, sem, contudo, tal configurar a afirmação de uma tese debatida no precedente”.
Firmava, assim, o entendimento de que se o precedente tem origem em recurso que não fora conhecido, tal não poderia servir como paradigma para efeito de caracterizar eventual divergência e consequente conhecimento de incidentes interpostos junto à TNUJEF’s.

Não obstante, foi firmada a tese de que precedentes oriundos de recursos não conhecidos podem servir como paradigmas para efeito de configuração da divergência e conhecimento de incidentes interpostos perante a TNUJEF’s, desde que traga em seu teor (ementa e voto condutor) a referência à eventual tese já debatida na Corte.

Considerou-se que, mesmo não conhecido o recurso, a decisão pode firmar a tese na qual se baseou, inclusive, para não conhecer daquela irresignação. Assim, se resta firmada uma tese, indene de dúvidas, mesmo que no bojo de recurso não conhecido, tal pode servir como paradigma.

O relator para o acórdão será o juiz federal OTÁVIO HENRIQUE MARTINS PORT.

 

II. Portador de HIV, assintomático. Residente em pequenas localidades. Conhecimento desse fato pela população local. Estigmatização. Benefício assistencial. Concessão. Impossibilidade.

No julgamento do Processo nº 2008.72.58.00.1726-0, o relator, juiz federal RONIVON DE ARAGÃO, firmou o entendimento de que o portador de HIV mesmo que seja assintomático, pode obter benefício assistencial, desde que prove ser morador de uma pequena localidade e na qual esse fato seja de todos conhecido, o que, por si, geraria estigmatização social.

Para o relator é preciso “deixar assentado, neste momento processual, que o fato relativo à residência da recorrente em pequena localidade não se encontra contrariado nos autos. É ponto incontroverso, muito embora o acórdão recorrido haja considerado que tal não seria suficiente para a concessão do benefício”
E acrescentou: “Em casos tais em que o portador da doença reside em áreas de grande adensamento populacional a estigmatização se encontra relacionada à manifestação sintomática, visível a “olho nu”. Também tal ocorre nos casos em que a atividade habitual do aspirante ao benefício (quer assistencial, quer previdenciário) se mostre incompatível com o mal que o acomete, a exemplo de cozinheiros, enfermeiros, instrumentadores cirúrgicos etc. No caso presente, restou comprovado (não se trata de ponto controverso) de a autora sempre haver residido no município mencionado, sendo que a presunção de estigmatização prescinde de tais critérios, vez que irrelevantes diante da circunstância de que em cidades desse porte tal fato acaba se tornando público e notório. É dizer: em pequenas povoações, a estigmatização decorre do mero fato de ser portador da doença, que se entende como contagiosa”.

Propugnava pelo provimento total do incidente.

Houve empate na votação, com voto de desempate do Ministro Presidente do Colegiado, tendo sido firmada a tese de que, no caso dos autos, o provimento haveria de ser apenas parcial do incidente, devendo ser baixado o feito à origem, a fim de se verificar as condições pessoais da parte autora, bem como se havia algum sintoma da enfermidade.

O relator para o acórdão será o juiz federal IVORI SCHEFFER.

 

III. Embargos de declaração. Recurso de fundamentação vinculada. Limites do art. 535 do CPC. Recurso que não aponta contradição, dúvida ou obscuridade, fazendo-se o devido confronto entre trechos da decisão embargada. Embargos de declaração que não apontam a omissão acerca de ponto sobre o qual devia o juízo se pronunciar. Recurso que apenas se irresigna com o teor da decisão embargada. “Irresignação” que não se qualifica como fundamento vinculado para efeito de se interpor embargos de declaração. Não conhecimento.

No julgamento do Processo nº 2007.70.50.00.2845-7, o juiz federal RONIVON DE ARAGÃO proferiu voto-vista, no qual firmou o entendimento de que os embargos de declaração, por se tratar de recurso de fundamentação vinculada, devem se referir, de forma expressa, aos trechos da decisão reputados contraditórios, duvidosos ou obscuros e, no caso de omissão, devem expressar qual ponto devia se pronunciar o juízo, não o tendo feito.
Firmou, assim, que se os embargos de declaração limitam-se a expressar irresignação com a decisão embargada, fugindo dos limites impostos no art. 535 do CPC (secundados pelo disposto na Lei nº 9.099/95), o caso é não conhecimento do recurso.

Referindo-se ao que se entende por recursos de fundamentação vinculada, a exemplo dos embargos de declaração, afirmou o relator que “dito sistema de vinculação da fundamentação do recurso não se vê no que diz respeito à apelação e ao agravo de instrumento no processo civil e ao próprio recurso inominado no sistema dos Juizados Especiais. Nesses casos, a lei se contenta em dizer, simplesmente: cabe apelação (no processo civil comum) ou recurso inominado (no sistema dos Juizados) de sentença. Não se delimita o escopo da fundamentação que deve conter nesse recurso. A delimitação é, meramente, quanto à adequação ao tipo de decisão que foi proferida, por exemplo, apelação de sentença ou agravo de decisão interlocutória”.

E acrescentou: “Mas, no que se refere aos embargos de declaração, tanto a Lei nº 9.099/95, quanto o Código de Processo Civil foram específicos. Ou seja: embora tal recurso caiba em face de sentença e de acórdão, por exemplo, exige-se que somente assim ocorra quando houver: omissão, contradição, obscuridade ou dúvida. Sendo assim, além da tempestividade, da adequação ao tipo da decisão, os embargos de declaração devem conter no seu teor a indicação precisa da omissão, da contradição, da obscuridade ou da dúvida (esta última, no caso da Lei nº 9.099/95). E tais vícios devem ser apontados e indicados precisamente no confronto entre pontos INTERNOS da decisão embargada”.

Conclui, ao final, que:

O conhecimento dos embargos de declaração deve se cingir ao seguinte: se a descrição contida nesse recurso pertine a uma suposta omissão, contradição, obscuridade ou dúvida da decisão, isto é, se tais vícios são apontados no confronto entre os diversos aspectos internos da decisão. Ou se se trata de mero inconformismo ou confronto do teor da decisão embargada com outros decisórios externos, por exemplo, o que redunda, em última análise, em discordância do decisum embargado.

Se a primeira hipótese ocorre, conhece-se dos embargos. No segundo momento, verificar-se-á se existe razão nos fundamentos do embargante. Na segunda hipótese, sequer se deve conhecer dos embargos, pois o que se aponta não é, nem em tese, contradição, omissão, obscuridade ou dúvida de pontos internos do julgado, mas meramente inconformismo ou confrontação desse julgado recorrido com outros decisórios daquele mesmo juízo ou de outras instâncias.

A fundamentação do voto foi seguida por maioria e a sua conclusão, pelo não conhecimento dos embargos de declaração, também por maioria.

 

IV. Prova pericial. Especialidade. Médico perito. Discussão. Alegação de se tratar de mera questão processual. Descabimento. Ponto que diz respeito à própria possibilidade

No julgamento do Processo nº 2008.72.51.00.1862-7, da relatoria da juíza federal JACQUELINE MICHELS BILHALVA, foi reafirmada a tese de que a discussão acerca da efetivação de prova pericial por médico especialista não se trata de mera questão processual.

O fundamento reportado foi o de que tal ponto diz com o próprio direito material ao benefício postulado pela parte, podendo a TNUJEF’s conhecer da matéria. A relatora assim consignou:

Por outro lado, na linha do que já foi decidido por esta Turma Nacional no PEDILEF nº 2008.72.51.00.3146-2, da relatoria da Juíza Federal Joana Carolina Lins Pereira, e no PEDILEF nº 2008.72.51.00.3649-6, da relatoria do Juiz Federal Cláudio Canata, ambos julgados na sessão de novembro de 2009, impende reconhecer que a questão versada no presente pedido de uniformização não é meramente processual.

Primeiro porque o trato acerca das características da prova pericial admissível em casos envolvendo discussão sobre capacidade laborativa, assim como das características da prova material admissível em relação a tempo de serviço rural, não envolve o reexame da prova, mas, sim, a valoração jurídica da prova, noção que inclui a identificação das características da prova admissível.

E, segundo, porque a análise das características da prova pericial admissível é inerente à amplitude objetiva das garantias constitucionais da ampla defesa e do contraditório.

No exame do mérito e no caso específico dos autos, entendeu-se que havia necessidade de que médico especialista procedesse ao exame pericial, conforme fundamentou a relatora:

Nesse contexto, considerando que o presente caso envolve a investigação técnica de uma doença neurológica rara que caracteriza um quadro médico complicado, forçoso é reconhecer o direito à realização de perícia médica por médico especialista em neurologia, profissional dotado de conhecimento técnico suficiente para esse contexto.

Com efeito, não vejo como possa se argumentar, como constou do acórdão recorrido, que as respostas dadas pelo médico generalista teriam sido suficientes por terem sido conclusivas e convincentes.

Ora, o médico generalista naturalmente não possui capacidade técnica suficiente para analisar o quadro médico complicado, complexo, que acomete a autora. Prova disso é que, na verdade, tais respostas, em sua totalidade, não são conclusivas e nem convincentes, na medida em que o Sr. Perito respondeu que a autora não apresenta nenhum déficit cognitivo e nem alteração neurológica, já tendo recuperado o déficit cognitivo, apresentando meramente mínima redução de força em membro superior direito. Ocorre que dentre os exames médicos e achados médicos registrados durante internação hospitalar apresentados pela autora estão déficit cognitivo importante, hipodesenvolvimento físico pronunciado e retardo mental leve, não parecendo provável a pura e simples recuperação total destas 3 (três) manifestações.

Ademais, em sua última manifestação antes da sentença, no evento 47, o próprio perito registra a sua falta de capacidade técnica para definir a época em que teria ocorrido a recuperação do déficit neurológico, dizendo que “para tanto é imprescindível um exame físico neurológico realizado pelo médico perito”.
O voto foi seguido por maioria, pelo conhecimento e provimento do incidente.

 

V. Questão de Ordem nº 20 da TNUJEF’s. Alcance. Instâncias inferiores. Tese de direito material firmada. Turma Recursal de origem que não examinara toda a prova referida nos autos (documental e testemunhal). Provimento apenas parcial do incidente. Baixa do feito à origem para, em face da tese firmada, examinar o pedido da parte, tendo em conta as demais provas coligidas nos autos.

No julgamento dos Processos nº 2008.72.55.00.7778-3, da relatoria da juíza federal JACQUELINE MICHELS BILHALVA, e nºs 2006.72.95.01.5747-5 e 2008.72.51.00.1832-9, da relatoria do juiz federal RONIVON DE ARAGÃO, firmou-se a tese de que a interpretação da Questão de Ordem nº 20 da TNUJEF’s não pode abranger situações em que a Turma Recursal de origem não examinara todo o teor do conjunto probatório dos autos.

Assim, se a TNUJEF’s firma uma tese de direito material (a exemplo de um documento que entende se enquadrar no conceito de início de prova material, diferentemente do julgado recorrido), mas a Turma de origem não examinara o restante do conjunto probatório debatido na sentença do juízo do JEF (a exemplo da prova testemunhal), o provimento do incidente há de ser apenas parcial. Dessa forma, firma-se a tese de direito material e determina a baixa do feito à Turma de origem para que, diante daquela tese firmada, possa examinar os demais aspectos da prova produzida no juízo do JEF de 1º grau e que não tinham sido debatidos no julgado fustigado.

Nesse ponto, a relatora do primeiro incidente acima citado, juíza federal JACQUELINE MICHELS BILHALVA, restou vencida, pois entendia que se devia dar provimento total, de logo, examinando-se o conjunto probatório já debatido na instância do JEF, mesmo que não expressamente reportado no julgado recorrido da Turma Recursal, invocando o teor da Questão de Ordem nº 20 da TNUJEF’s. No caso desse incidente, o relator para o acórdão será o juiz federal JOSÉ EDUARDO DO NASCIMENTO.

No caso dos outros dois incidentes acima reportados, o voto do relator, juiz federal RONIVON DE ARAGÃO, foi seguido, por maioria, pelo conhecimento e provimento apenas parcial, mesmo escore daquele outro julgamento.

 

VI. Benefício Assistencial. Renda per capita. Renda percebida por idoso, genro da parte autora, filha maior dessa mesma parte e o cônjuge do qual está separada. Cômputo. Descabimento.

No julgamento do Processo nº 2007.39.00.70.2065-4, da relatoria da juíza federal JACQUELINE MICHELS BILHALVA, garantiu-se a manutenção de benefício assistencial à pessoa com deficiência cujo pagamento havia sido suspenso pelo INSS. A alegação era a de que a renda per capita da família da beneficiária ultrapassaria o máximo previsto em lei.

A questão é que na hora de fazer os cálculos, a autarquia previdenciária computou o benefício assistencial de valor mínimo recebido pelo pai da autora, também deficiente e já idoso, o qual, segundo o entendimento da própria TNU, deveria ter sido excluído da conta.

A exclusão deve ocorrer com base na aplicação do artigo 34 do Estatuto do Idoso que disciplina que benefício de valor mínimo concedido a idoso não entre no cômputo da renda de novo benefício assistencial dentro da mesma família.
Outro fator relevante foi destacado pela relatora do processo na TNU, juíza federal Jacqueline Bilhalva. Lembrou a relatora, em seu voto, que a comprovação da existência de miserabilidade prevista em lei não é absoluta, podendo ocorrer também por outros meios. “Como já se encontra uniformizado nesta Turma Nacional desde 2007, a questão da comprovação da miserabilidade vem sofrendo modificações jurisprudenciais, para considerar que o preceito contido no artigo 20, § 3º da Lei 8.742/93 não é o único critério válido para comprová-la”, afirmou a magistrada.

Ainda na mesma sessão, a juíza federal Jacqueline Bilhalva foi a relatora do processo 2008.32.00.70.3412-3, cuja decisão voltou a envolver a questão do cálculo da renda per capita e a análise do que se pode considerar ou não como requisito de miserabilidade. Neste caso, o problema foi que o INSS incluiu as rendas do genro e da filha da requerente no cálculo, o que levou à conclusão de que a família seria capaz de prover a subsistência da autora. O acórdão considerou ainda a possibilidade de que a autora, com base no art. 1.704 do Código Civil, solicitasse pensão ao ex-marido.

Acontece que a concessão de benefícios assistenciais possui disciplina própria e especial na Lei nº 8.742/93, a qual, no § 1º do art. 20, com a redação dada pela Lei nº 9.720/98, determina que, para efeitos de concessão de benefícios assistenciais, “entende-se como família o conjunto de pessoas elencadas no art. 16 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991, desde que vivam sob o mesmo teto”, entendimento seguido pela TNU e que, no caso, exclui do grupo familiar: I – o genro e a filha maior da autora, que é idosa, porque, embora vivam sob o mesmo teto com ela, não constam do rol previsto nos referidos dispositivos como integrantes do mesmo grupo familiar para fins assistenciais e previdenciários; e II – o cônjuge da autora, do qual ela está separada, por não viverem sob o mesmo teto.

Nesse sentido, a Turma Nacional, por unanimidade, seguiu o entendimento da relatora de que “para fins de concessão de benefício assistencial, o conceito de grupo familiar deve ser obtido mediante interpretação restrita das disposições contidas no § 1º do art. 20 da Lei nº 8.742/93 e no art. 16 da Lei nº 8.213/91”. Principalmente, levando-se em conta que, por ser o benefício assistencial de natureza continuada, em regra vitalício, afigura-se razoável o critério legal de exclusão do grupo familiar daqueles parentes que o estejam integrando de modo meramente circunstancial e efêmero, haja vista a tendência natural de que filhos maiores, genros, sobrinhos e outros parentes não elencados no art. 16 da Lei nº 8.213/91 venham a conduzir seus próprios núcleos familiares para moradias próprias com economias familiares próprias.

A TNU também entendeu que a possibilidade da autora pedir pensão alimentícia ao cônjuge do qual já se acha separada no âmbito do Direito de Família, além de depender da capacidade econômica do ex-marido, não afasta a concessão do benefício assistencial, a qual somente poderia ser afastada caso a autora já fosse beneficiária de pensão alimentícia e possuísse renda própria suficiente que afastasse sua condição de miserabilidade.

Dessa forma, a TNU reformou o acórdão para excluir do grupo familiar da autora seu genro, sua filha maior e o cônjuge do qual está separada, concluindo que a autora tem direito a receber o benefício, conforme análise já realizada na sentença de primeiro grau.

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