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Juízes federais debatem pesquisa do Ipea sobre os JEFs

publicado 20/09/2012 16h20, última modificação 11/06/2015 17h04

No Seminário sobre os 10 anos dos Juizados Especiais Federais, onde pesquisadores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) apresentaram os resultados da pesquisa “Acesso à Justiça Federal: 10 anos dos juizados especiais federais”, juízes federais que atuam nos JEFs também puderam participar dos debates, avaliando os resultados da pesquisa. O evento, que aconteceu no dia 13 de setembro, na sede da Seção Judiciária do Paraná, em Curitiba, assim como a pesquisa, foram realizados por iniciativa do Centro de Estudos Judiciários (CEJ) do Conselho da Justiça Federal (CJF).

O juiz federal Manuel Maia de Vasconcelos Neto, da Seção Judiciária do Rio Grande do Norte, salientou, inicialmente, que os juizados especiais federais nasceram sem nenhuma estrutura – eles começaram a funcionar mediante realocação de recursos humanos e espaços já existentes nas varas federais. Este fator está na origem de grande parte das deficiências dos juizados, argumenta o juiz.

A exigência ou não de prévio requerimento administrativo no INSS como condição para ajuizar uma ação no juizado, critério que hoje varia de uma região para outra, no entendimento do juiz, influencia o fato de eles serem considerados “balcões do INSS”. “Há regiões onde o INSS nem atende a pessoa”, justifica Manoel Maia.

Quanto ao alerta de que o juizado, muitas vezes, é confundido com uma instituição assistencialista, Manoel Maia lembra que os seus usuários são realmente pessoas muito pobres. Muitos, segundo ele, residem longe da sede do juizado, às vezes não possuem sequer o dinheiro suficiente para esse deslocamento e não é raro que esses usuários necessitem de atendimento médico porque estão com fome. “A Justiça do Trabalho tem usuários mais aquinhoados, porque eles pelo menos tem um emprego”, acentua.

As escolas da magistratura, na visão do magistrado, têm um papel destacado no sentido de orientar o magistrado que está ingressando na carreira sobre a atuação do juizado. “É importante que ele comece a carreira no juizado”, argumentou Manuel Maia. No estágio probatório desses juízes, também poderia haver um controle maior das corregedorias, na sua concepção. “Precisamos nos policiar diariamente para não ficarmos embrutecidos”, refletiu.

A alegação de que o processo eletrônico, presente em 76% dos JEFs, provoca a desumanização desses espaços, para Manuel Maia, é falsa.  “O processo eletrônico não é excludente. Minha vara hoje é exclusivamente virtual, o advogado não vai lá, só o cidadão”, observa. A virtualização, de acordo com ele, tem a vantagem de tirar o advogado do balcão de atendimento e, além disso, o próprio cidadão pode acompanhar o seu processo a distância. A pesquisa do Ipea, na sua avaliação, será positiva para ao juizados. “É bom que a gente conheça a Justiça. Pode doer, mas vamos ficar melhor”, afirmou.

Na análise da juíza federal Vanessa Vieira de Mello, dos Juizados Especiais Federais de São Paulo, um dos pontos mais “tenebrosos” dessas unidades, atualmente, é a falta de cumprimento das decisões judiciais pelo INSS. “Em São Paulo temos 27 mil decisões pendentes”, afirma a juíza, acrescentando que em 90% dos processos em tramitação nos juizados paulistas o INSS não cumpre as decisões. 

Outro ponto difícil, para ela, é o sobrestamento dos recursos repetitivos - no Superior Tribunal de Justiça - e daqueles que são objeto de repercussão geral no Supremo Tribunal Federal – ou seja, a necessidade que os juízes dos JEFs têm de suspender a apreciação de processos que aguardam esse tipo de julgamento no STJ ou no STF. “Acabamos com um trabalho um tanto ou quanto amarrado”, assinala Vanessa Mello.

Os juízes que atuam nos juizados, segundo ela, também relatam muitas dificuldades no relacionamento com a Fazenda Nacional. Rodadas de negociações com esse órgão, no entendimento da juíza, seriam produtivas para a resolução de muitos processos. Em termos de conciliações nos JEFs, o maior êxito até hoje obtido foi com a Caixa Econômica Federal, em processos que envolvem financiamentos habitacionais. “Há necessidade de maior elasticidade dos representantes de órgãos públicos na realização de acordos”, pontua Vanessa Mello.

A ausência da Defensoria Pública da União, que faz muita falta tanto nas atermações dos pedidos quanto nas audiências de conciliação, instrução e julgamento, é mais um problema apontado pela juíza. Ela chama a atenção para a dificuldade do magistrado do JEF na sua tarefa de orientar a parte, sem advogar por ele, ao presidir as audiências. “A gente se sente muito solitário ali. Às vezes, estamos sozinhos com a parte, e em muitos casos medindo as palavras, para que a audiência tenha uma boa condução”, comenta. 

Vanessa Mello acentua que, embora beneficiados por um alto grau de informatização, existe “uma verdadeira torre de babel na Justiça Federal em termos de sistemas processuais”, já que cada região tem um sistema processual diferente. Para ela, é importante refletir sobre a necessidade de contar com um sistema processual único.  Um sistema unificado de cálculos na Justiça Federal, da mesma forma, seria uma providência salutar, na opinião da juíza. Para ela, falta um critério único e uma tabela atualizada de cálculos e também uma maior responsabilidade por parte dos entes federais, que segundo ela não conferem os cálculos.

Os magistrados que atuam nos juizados, segundo destacou o juiz federal Marco Falcão Critsinelis, da Seção Judiciária do Rio de Janeiro, superam muitas dificuldades por iniciativa própria, tanto deles quanto dos servidores. “Nós nos viramos para prestar a jurisdição”, afirma, e acrescenta que “este é um ponto a ser apreendido por nós para travarmos uma nova relação entre o Poder Judiciário, a estrutura dos juizados e seus juízes”.

De acordo com o juiz, é importante sublinhar que a pesquisa levou em consideração a estrutura dos JEFs e a diversidade entre as regiões e isso exige cautela na análise dos resultados. A metodologia da pesquisa, na avaliação de Critsinelis, levou em consideração determinados vetores e privilegiou determinado ponto de vista que pode levar a dificuldades no resultado geral.

Um fator crítico, para ele, é a visão do juizado como uma mera substituição do Poder Executivo. “O Poder Judiciário não pode ser confundido como um prestador de serviço da Administração Pública. As pessoas que usam o juizado deveriam estar exercendo o seu direito de petição (junto aos órgãos administrativos) e não o seu direito de ação. Esta visão de cidadania apenas pelo acesso à Justiça é equivocada”, opina. No entendimento de Critsinelis, a pesquisa não apresenta soluções, e sim uma radiografia. “Nós, do Judiciário, é que temos que buscar as soluções”, afirma.