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Painel discute auxílio mútuo em matéria penal no Seminário Franco-Brasileiro sobre Cooperação Judiciária

publicado 13/11/2013 09h40, última modificação 11/06/2015 17h04

Auxílio mútuo em matéria penal foi tema do primeiro painel do Seminário Franco-Brasileiro sobre Cooperação Judiciária em Matéria de Criminalidade Ligada aos Grandes Tráficos. O evento realizado pelo Centro de Estudos Judiciários (CEJ) do Conselho da Justiça Federal (CJF) começou na tarde desta terça-feira (12/11) – com a presença de magistrados e promotores – e acontece até quinta-feira (14/11), na sede do CJF, em Brasília.

No início do painel, mediado pela magistrada de ligação da França no Brasil, Carla Deveille-Fontinha, o diretor do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional do Ministério da Justiça, Ricardo Saadi, abordou os canais de auxílio mútuo entre os dois países. Segundo o palestrante, a internacionalização das organizações criminosas e a globalização do mundo a partir da década de 1990 levaram à necessidade de aumento do diálogo e da cooperação internacional.

“As organizações criminosas também se aproveitaram desse contexto. Grande parte dos recursos dessas organizações está no exterior. Isso mostra que elas atuam em mais de um país. E ao se internacionalizar, o crime organizado trouxe grande preocupação para a comunidade internacional. A maioria dos acordos de cooperação e tratados surgiu a partir do final dos anos 90 e trata do combate ao crime organizado transnacional”, explicou.

De acordo com Ricardo Saadi, não adianta só prender os criminosos. “Temos que tirar a capacidade financeira da organização, criminalizar a lavagem de dinheiro, fortalecer a cooperação externa e trabalhar em parceria em todos os momentos”, afirmou o diretor do Departamento do Ministério da Justiça, que descreveu ainda os dois tipos de cooperação: direta e jurídica.

A primeira pode ser realizada informalmente, por meio de consulta a autoridades policiais, ao Ministério Público, ao órgão de inteligência financeira, dentre outros. Já a cooperação jurídica tem caráter formal de intercâmbio e não prescinde da intermediação de uma autoridade central, no caso do Brasil, o Ministério da Justiça. As solicitações e pedidos envolvem atos de comunicação processual, obtenção de provas, medidas cautelares, repatriação de ativos etc.

No entanto, na opinião do palestrante, a quantidade de ferramentas disponíveis no campo da cooperação jurídica não será efetiva enquanto o sistema processual brasileiro não for reformulado. “Precisamos pensar em tomar medidas para que o processo judicial brasileiro acabe mais rápido. Da forma como está, o Brasil perde credibilidade com os outros países”, criticou Ricardo Saadi.

Além disso, o diretor do Ministério da Justiça acredita que a maioria das autoridades brasileiras ainda não está preparada para fazer corretamente um pedido de cooperação. “Cada país tem suas particularidades. O papel da autoridade central é justamente conhecer todas essas particularidades para orientar. Quando recebemos um pedido para ser encaminhado a outro país, verificamos se os requisitos estão preenchidos antes de enviar”, informou.

Conforme levantamento do Ministério da Justiça, em 2013, o Rio Grande do Sul é o estado brasileiro que mais formulou pedidos de cooperação. Do total de pedidos formulados pelo Brasil a outros países, 84% são ativos. As respostas de ativos são recebidas em aproximadamente nove meses, e de passivos, em 11 meses. Desde 2004, tramitaram 336 pedidos em matéria penal da França, sendo que 70% foram cumpridos, 10% parcialmente cumpridos e 20% não cumpridos. A maioria, 52,5% é de comunicação de atos processuais. Entre 2011 e 2013, foram oito pedidos relativos ao tráfico de drogas e dois relacionados ao tráfico de pessoas.

Canais franceses

Após a palestra de Ricardo Saadi, o magistrado do Departamento de Cooperação Judicial do Ministério da Justiça da França, Stéphane Dupraz, falou aos participantes do evento sobre os canais de ajuda mútua disponíveis na França. “A nossa autoridade central também é o Ministério da Justiça. No departamento em que atuo, fazemos apenas ajuda mútua operacional. As negociações estão a cargo de outro setor”, revelou o palestrante. A principal função do órgão é assessorar autoridades que quiserem formular pedidos. “Somos muito solicitados por membros do Ministério Público e juízes”, declarou.

Stéphane Dupraz também disse que o Ministério da Justiça da França tem função de ajudar autoridades de outros países sobre as exigências para realização de pedidos de cooperação. “Existem diferentes canais de cooperação, mas o uso de cada um deles depende dos instrumentos que se aplicam”, comentou o magistrado francês. No total, a França possui 16 magistrados de ligação, que funcionam como uma espécie de “embaixador judiciário”. “É extremamente útil ter um magistrado no Brasil”, avaliou.

Segundo o palestrante, na França, é possível pedir tudo que está previsto no Código Penal do país. “As demandas também são executadas de acordo com o código francês. Inclusive, as autoridades brasileiras podem estar presentes, só não podem interferir”, pontuou. Os pedidos, para serem aceitos pela autoridade central francesa, precisam descrever quem é o solicitante, os meios de contatos, possuir fundamentação legal, um resumo dos fatos, bem como classificação jurídica do crime, tradução, entre outras exigências.

“É preciso que a demanda seja traduzida por um tradutor profissional, ainda que não seja juramentado”, frisou Stéphane Dupraz. Ainda assim, é possível que o pedido seja recusado, caso a demanda seja contra a soberania, segurança e ordem pública, ou que envolva questões de ofensa política, ou ainda quando não há correspondente no código francês para o crime relatado. “Essa cooperação entre Brasil e França funciona bem e em prazos razoáveis”, avaliou o magistrado.