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Deveres de proteção do Estado em matéria de direitos fundamentais é tema de palestra

publicado 09/09/2013 08h50, última modificação 11/06/2015 17h04
 
“Direitos Fundamentais e Dever de Proteção do Estado: limites e responsabilidades do controle judicial” foi o tema da palestra do professor da Pontifícia Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Ingo Sarlet,  no seminário 25 Anos da Constituição Cidadã: olhar para o passado, reflexão sobre o presente e construção do futuro, na última sexta-feira (6). O evento foi promovido pelo Centro de Estudos Judiciários (CEJ) do Conselho da Justiça Federal (CJF), no auditório do Superior Tribunal de Justiça (STJ).  O presidente da mesa foi o desembargador federal Mairan Maia, diretor da Escola da Magistratura Federal da 3a Região.

 

A palestra tratou da natureza jurídico-constitucional dos deveres de proteção e promoção estatais em matéria de direitos fundamentais e as possibilidades e limites em termos de concretização desses deveres. A análise focou principalmente o papel do Poder Judiciário, que ostenta tanto a condição de destinatário dos deveres de proteção, quanto de ator que zela pelo cumprimento dos deveres de proteção pelos demais atores estatais.

 

Para Ingo Sarlet, em termos próximos do ideal, o Estado não protege efetivamente os direitos fundamentais. “Em termos ideais, é claro, nenhum Estado cumpre integralmente com os seus deveres de proteção. Mas, sim, em termos graduais e ainda de modo diferenciado em relação às diversas áreas onde se projetam tais deveres. No Brasil não é diferente, embora, é claro, pelos níveis de violação de direitos ainda existentes e de falta de efetividade, ainda tenhamos problemas relativamente sérios nessa seara”, avalia.

 

Ele ressalta que os limites e as possibilidades do controle judicial da atuação do Estado na proteção dos direitos fundamentais dependem de um conjunto de fatores, desde a própria estruturação do Poder Judiciário e de suas competências, até os instrumentos postos à disposição da cidadania para, pelo Poder Judiciário, provocar a sua intervenção, passando por critérios jurídicos como o da proporcionalidade e o da reserva do possível. Ingo Sarlet salienta que, após a Constituição de 1988, verifica-se no Brasil  uma atuação intensa do Poder Judiciário em todos os níveis, o que tem até mesmo levado à crítica, para ele em grande parte incorreta, de um “excessivo ativismo judicial” ou mesmo de uma “judicialização da politica”.

 

Há, segundo Ingo Sarlet, duas formas de o Estado violar deveres de proteção: não fazer nada ou realizar ações insuficientes. O problema, para ele, é definir como e quando determinar que o Estado não agiu de forma suficiente. “Não se exige do Estado níveis máximos do dever de proteção, e isto já é um problema em si”, comenta. Definir o quanto uma medida de proteção é suficiente ou não, na sua opinião, é o grande drama hoje enfrentado pelos operadores do Direito.

 

Ele conta que esse drama foi enfrentado pelo Tribunal Constitucional Alemão em um caso emblemático. Na década de 1970, um grande industrial daquele país foi sequestrado por um grupo terrorista, que exigiu, em troca da libertação do refém, que a polícia pusesse em liberdade membros do grupo que se encontravam presos. O filho do industrial entrou com uma ação no TCA pedindo que autorizasse essa medida. O tribunal, no entanto, negou essa proteção. De acordo com Ingo Sarlet, o raciocínio do tribunal foi o de que os terroristas soltos poderiam cometer novos atentados, afetando toda a coletividade. Além disso, não haveria certeza de que o pai do solicitante seria mesmo libertado. O que a polícia poderia fazer estava sendo feito. “Aquele resultado específico não era exigível do Estado”, comenta o professor. No entanto, ele acentua que o desfecho dessa decisão foi trágico, já que, horas depois, o industrial foi encontrado morto. “Por mais que se possa falar em níveis máximos de dever de proteção, há níveis conflitantes”, avalia.

 

Sarlet acrescenta que também não é exigível do Estado a exclusão absoluta da ameaça de violação a direitos. Não é exigível, por exemplo, que o Estado  coloque um policial em cada esquina para excluir qualquer ameaça à segurança pública. A campanha do desarmamento, feita pelo Estado há alguns anos atrás, para Sarlet é um exemplo de que  não se pode subtrair totalmente do cidadão o seu direito de autotutela. “A proibição absoluta da aquisição de armas de fogo é inconstitucional”, opina o professor. Ou seja, não é razoável que o cidadão esteja totalmente desprovido de alternativas de autotutela mínima. “Quem decide sobre o mínimo de eficiência dos deveres de proteção estatal?”, indaga o professor.

 

Para ele, ainda há ainda muito déficit nesse campo. Muitos defensores dos direitos humanos, segundo ele, demandam uma intervenção estatal no nível máximo. “Mas otimizar tudo significa não otimizar nada. Se tudo tiver prioridade absoluta, nada terá prioridade.  Nós, atores judiciais, temos de nos preocupar como isso vai funcionar”, afirma.

 

 Fonte: CJF