Você está aqui: Página Inicial > Notícias > 2014 > Maio > Aspectos Controvertidos do Direito do Seguro é tema de palestras

Aspectos Controvertidos do Direito do Seguro é tema de palestras

publicado 22/05/2014 13h45, última modificação 11/06/2015 17h04

Na tarde de quarta-feira, dia 21 de maio, os Aspectos Controvertidos do Direito do Seguro foram o tema das discussões do I Congresso Internacional de Direito do Seguro. O evento – que acontece até amanhã no auditório externo do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em Brasília – é uma promoção do Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal (CEJ/CJF) em parceria com o STJ e o Instituto Brasileiro do Direito do Seguro (IBDS). O objetivo é expor o panorama atual dos contratos de seguro no sistema jurídico nacional e internacional, analisando as principais questões controvertidas na doutrina e na jurisprudência.

 

O painel foi presidido pelo ministro do STJ Moura Ribeiro e contou com a participação do Mestre em Direito pela Universidade de Cambridge (Inglaterra) e Doutor em Direito Civil pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro – UERJ, José Roberto de Castro Neves e do Professor Titular da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, Humberto Theodoro Júnior.

 

O jurista José Roberto falou sobre a relação entre “Direito civil-constitucional e direito do seguro”. Segundo ele, o Direito atual vive enorme crise. Uma tensão que surge da necessidade de se buscar outro sistema jurídico, mais sensível aos valores éticos e morais da sociedade, sem, ao mesmo tempo, perder a segurança jurídica proporcionada pelo sistema jurídico anterior. Para ele, a Constituição é o referencial que vai garantir a construção desse novo modelo jurídico. “Toda a legislação terá de ser revista e analisada sob o prisma constitucional”, pontua.

 

Diante desse quadro, o seguro tem uma função cada vez mais relevante na sociedade. Para ele, o seguro tem que ser compreendido não como uma facilidade, mas como uma necessidade prática da vida cotidiana. “Tendo em vista a falência do Estado no que diz respeito à prestação de serviços essenciais à população, muitas pessoas precisam se valer do seguro para obter serviços essenciais como a saúde, por exemplo”, argumenta. Dentro desse contexto, “o seguro tem uma função social diferenciada”, afirma.

Em sua conclusão, o jurista disse que o futuro do direito do seguro acena com duas possibilidades: publicização total, em que todos poderão ter acesso aos serviços oferecidos pelas seguradoras, naquilo que seria quase que uma espécie de “comunismo do seguro”; ou a volta ao cenário privado absoluto, caracterizado pelas análises super detalhadas, que têm por objetivo aferir o que é, de fato, o mais justo nas relações entre segurados e seguradoras.

 

Salvamento e contenção

– Na segunda palestra da tarde, o professor Humberto Theodoro Júnior apresentou o tema “Despesas de salvamento e despesas de contenção: regime jurídico”. O jurista iniciou sua fala explicando o conceito de contrato de seguro previsto no Código Civil, no qual o segurador se obriga a garantir o interesse legítimo do segurado contra riscos predeterminados. “A essência desse negócio jurídico situa-se, de um lado, na assunção, pelo segurador, da garantia de determinado interesse do segurado que contrata um serviço específico, que é o da cobertura securitária”, pontuou.

 

Segundo Humberto Teodoro, o contrato de seguro pertence à categoria dos contratos comutativos, onerosos e bilaterais. “O seguro funciona como uma transferência de risco: um profissional especializado assume o risco, que é inerente ao segurado, que, então, se libera do perigo de que seu interesse seja sacrificado”, lembrou.

 

O professor ressaltou também que o contrato gera deveres e obrigações às partes, alguns oriundos do acordo de vontades, e outros, da própria lei, como é o caso do dever de salvar ou tentar salvar o bem segurado quando ocorre um sinistro. É o chamado instituto do salvamento, previsto no artigo 771 do Código Civil, que diz, no caput: “Sob pena de perder o direito à indenização, o segurado participará o sinistro ao segurador, logo que o saiba, e tomará as providências imediatas para minorar-lhe as consequências”. Complementado pelo parágrafo único: “Correm à conta do segurador, até o limite fixado no contrato, as despesas de salvamento consequente ao sinistro”.

 

Para o palestrante, fica claro no texto legal que se trata de uma obrigação de reembolso pela seguradora dos valores gastos pelo segurado no esforço de salvar ou de tentar salvar o bem segurado quando acontece um sinistro. O problema é que, a título de regulamentar esse dispositivo, alguns órgãos lançam mão de normativas diversas ao que foi traçado pela lei, e pecam ao reduzir ou transformar uma obrigação legal, mudando sua natureza, e prejudicando a parte que deveria estar sob proteção.

 

É o caso, segundo Theodoro Junior, da Circular 256/ 2004 da Susep (Superintendência de Seguros Privados), classificada pelo jurista como uma norma nula. “Não é um conflito de normas, daquele que por vezes se estabelece entre regulamento e lei regulamentada, é um caso de invalidade. Esse regulamento não vale nada, é nulo, porque sua força adviria justamente da sua subordinação à lei, de sua sintonia com a norma hierarquicamente superior, mas, ao contrário, a circular da Susep está em contraste com o Código Civil”.

 

Ele lembrou ainda que é possível determinar, na apólice, limites das despesas com o salvamento, a fim de evitar condutas abusivas por parte do segurado. Mas, destacou que esse limite que deve ser proporcional ao que seria normalmente gasto, sob o risco de tornar-se uma cláusula nula.

Adicionalmente, o jurista afirmou que as instruções da circular da Susep entram em atrito com a função social do contrato. “A eficácia econômica de um contrato de seguro não se restringe à seguradora e segurado, é um fenômeno social. Afinal, mais do que qualquer outro, o contrato de seguro está inserido num conjunto de comunhão de interesses e de recursos que forma o patrimônio que vai sustentar as coberturas. A seguradora não paga a indenização com dinheiro próprio e sim com o capital comum dos segurados”.

 

Conclusões

 

Ao final de sua palestra, o professor Humberto Teodoro Junior fez questão de deixar as seguintes conclusões:

1)    “A obrigação contratual do segurador de indenizar o dano corresponde à lesão ao interesse garantido do segurado. É uma obrigação distinta da obrigação legal, prevista no artigo 771 do CC, que consiste no reembolso dos gastos efetuados e não de indenização”.

2)    “A obrigação de reembolso, quando ocorrente, não pode ser incluída no limite da garantia do seguro, dada a diversidade de fonte e de função que se verifica entre as duas obrigações do segurador: a obrigação de honrar a cobertura e a obrigação de reembolsar o segurado pelos dispêndios de salvamento do bem segurado”.

3)    “O contrato de seguro pode estabelecer limites para o reembolso, mas não é lícito excluir a responsabilidade legal, nem impor limitação abusiva capaz de quebrar a boa fé negocial e frustrar a função social do contrato de seguro”.

4)    “Não existindo limitações específicas no contrato, o reembolso das despesas de salvamento será feito até o valor da garantia assumida por meio do seguro, sem prejudicar a cobertura do segurado”.

5)    “Para fazer jus ao reembolso dos gastos de salvamento, o segurado não está obrigado a contratar garantias securitárias também para esse fim, porque o reembolso decorre de obrigação legal e não de ajuste negocial”.

6)    “O segurador pode estatuir o limite de sua responsabilidade, mas não é lícito reduzi-la a proporções ínfimas em relação ao valor econômico em jogo - o valor do seguro-, pois isso equivaleria, praticamente, a suprimir a obrigação legal a que se acha sujeito”.