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Juiz federal fala de temas do Direito Administrativo com grande repercussão na jurisprudência

Ciclo de Estudos

por publicado: 05/05/2017 17h45 última modificação: 05/05/2017 17h45
Painel abriu o segundo dia do evento realizado em Brasília e transmitido ao vivo pelo YouTube

O juiz federal da Seção Judiciária do Amazonas, professor e editor do blog Dizer o Direito, Márcio André Lopes Cavalcante, abriu a programação desta sexta-feira (5), segundo e último dia do Ciclo de Estudos: Tribunais Superiores em Temas da Justiça Federal, que abordou questões de Direito Administrativo. Em seu painel, o magistrado falou sobre os temas com grande repercussão na jurisprudência. A mesa foi presidida pela desembargadora do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) Gilda Maria Carneiro Sigmaringa Seixas.

A apresentação começou pela questão da responsabilidade civil do Estado no caso de morte de detento. Além desse tema, o juiz também tratou de questões envolvendo a admissão de servidores públicos com tatuagem; a greve no serviço público; o cultivo de drogas e expropriação de imóvel; e a prescrição de ações de ressarcimento ao erário. São assuntos que, segundo o magistrado, possuem vasta jurisprudência formada nos tribunais superiores, mas que ainda desperta muitas dúvidas em estudantes e operadores do Direito Administrativo.

Sistema carcerário

No início do painel, o juiz Márcio Cavalcante lembrou que o Estado possui o dever de garantir a integridade física e moral do detento. No entanto, essa responsabilidade é objetiva, pois se refere à omissão específica no cumprimento do dever especial imposto pela Constituição Federal. Nesse sentido, a responsabilidade é interpretada sob a teoria do risco administrativo. “É possível, portanto, que o Estado se exclua dessa responsabilidade se provar, por exemplo, que a morte de um detento não podia ser evitada”, explicou.

Até mesmo em caso de suicídio, o Estado possui responsabilidade, de acordo com o magistrado. “Há diversos precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça”, alertou. Entretanto, ainda nessa situação, é possível o Estado alegar que não houve omissão no cumprimento do dever de proteção do preso se, por exemplo, ficar comprovado que o suicídio ocorreu repentinamente, sem que o indivíduo tenha dado sinais de estar sofrendo uma depressão.

Outra questão recentemente pacificada pelo STF sobre a matéria diz respeito ao dever de o Estado indenizar o detento que se encontra em situação degradante. “É devida, inclusive, indenização por danos morais”, observou o juiz.

Concurso público x tatuagem

Segundo o palestrante, um concurso para soldado da Polícia Militar também foi alvo de muito debate e discussão no meio jurídico. A controvérsia se referia à exclusão de candidatos com tatuagens visíveis. “O que ficou decidido é que, em regra, o edital não pode estabelecer restrição a pessoas com tatuagem”, comentou. Para o juiz, a tatuagem, nos dias atuais, passou a ser vista como liberdade de expressão e artística, sendo a restrição de pessoas que a possuam uma discriminação arbitrária. A única ressalva desse entendimento é para quando a tatuagem possua conteúdo que viole valores constitucionais.

Greve de servidor público

O magistrado ressaltou que o servidor público tem direito de fazer greve. Essa previsão está no artigo 37 da Constituição Federal, porém o dispositivo estabelece que os termos e os limites devem ser definidos em lei específica, a qual ainda não existe. “Enquanto não for editada uma lei específica para servidores, eles podem fazer greve se valendo da lei de greve da iniciativa privada”, salientou Márcio Cavalcante.

Com relação ao desconto salarial dos dias parados, o STF também já se pronunciou sobre a questão. “A Administração Pública deve descontar, pois esse desconto é legítimo e possível, uma vez que a lei de greve da iniciativa privada classifica a greve como uma suspensão do contrato de trabalho, situação em que o trabalhador não trabalha e também não recebe – diferente da interrupção em caso de férias ou licenças, em que o trabalhador não trabalha, mas recebe”, esclareceu.

Além disso, o palestrante também destacou que a jurisprudência impõe que o administrador faça o desconto dos dias de greve com fundamento no princípio da legalidade, na indisponibilidade do interesse público e para não provocar o enriquecimento sem causa de servidores. No lugar do desconto, é permitida ainda a compensação dos dias e das horas de paralisação de servidor público, sem a necessidade de instalação, para nenhum dos casos, de um processo administrativo.

O desconto somente não pode ser feito caso a greve seja motivada por algum ilícito da Administração Pública, como atraso no pagamento de salários. “Esse exemplo não seria imaginável até pouco tempo atrás, mas estamos vendo agora diversas situações em que alguns estados estão deixando de pagar meses de salários aos seus servidores”, apontou.

Expropriação de imóvel por cultivo de drogas

Conforme o artigo 243 da Constituição Federal, se for encontrada cultura de plantas psicotrópicas em propriedade privada, é permitida sua expropriação (confisco) sem pagamento de indenização. Nesse caso, o imóvel deve ser destinado à reforma agrária ou à construção de habitações populares. “Não é necessária a comprovação de que o proprietário tenha participado diretamente da plantação. Basta que ele tenha agido com culpa”, alertou.

A culpa, de acordo com o juiz federal, pode ser in vigilando – quando identificada e comprovada a falta de fiscalização do imóvel por parte do proprietário; ou in elegendo – pela escolha de preposto responsável pela propriedade que estiver envolvido com a plantação. “O proprietário pode provar que não participou e que também não teve culpa, porém, o ônus da prova é invertido, ou seja, é do próprio proprietário a responsabilidade de provar a sua inocência”, afirmou.

Prescrição x ações de ressarcimento

De acordo com o juiz Márcio Cavalcante, até pouco tempo, a Fazenda Pública se valia, em muitos casos, da tese de que as ações de ressarcimento ao erário seriam imprescritíveis para danos provocados por particulares. Entretanto, segundo o magistrado, em caso de ilícito envolvendo particular, cabe sim a prescrição. Somente não prescrevem ações de ressarcimento decorrentes de atos de improbidade administrativa. Para a pretensão civil, o prazo prescricional é de três anos.

“Porém, o STJ possui uma jurisprudência muito forte, com base no princípio da isonomia e no Decreto nº 20.910/32, de que o prazo para que a Administração Pública demande deva ser de cinco anos, porque para ela ser demandada o limite também é de cinco anos”, ponderou o palestrante ao encerrar o primeiro painel da manhã.