Você está aqui: Página Inicial > Notícias > 2020 > 07 Julho > Ministro Mauro Campbell: Sistema de checks and balances impõe ao Judiciário o respeito à atividade tipicamente administrativa de outro poder

Notícias

Ministro Mauro Campbell: Sistema de checks and balances impõe ao Judiciário o respeito à atividade tipicamente administrativa de outro poder

por publicado: 21/07/2020 18h26 última modificação: 22/07/2020 14h30

O Ministro Mauro Campbell, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), concedeu entrevista ao Portal do CJF sobre a I Jornada de Direito Administrativo, evento que o Conselho da Justiça Federal (CJF) promoverá, de 3 a 7 de agosto de 2020, em formato virtual. O magistrado afirmou esperar que a Jornada “seja capaz de trazer luzes às Cortes Superiores, sobretudo ao Superior Tribunal de Justiça, na formação de sua jurisprudência”.

Realizadas pelo Centro de Estudos Judiciários (CEJ) do CJF, as Jornadas de Direito buscam delinear posições interpretativas sobre as normas vigentes, adequando-as às inovações legislativas, doutrinárias e jurisprudenciais por meio do debate entre especialistas e professores, com a produção e publicação de enunciados.

Seis comissões de trabalho foram formadas para apreciação e seleção das propostas de enunciados. As comissões são integradas por professores e especialistas convidados pelo CJF. Campbell preside a de n. 6, responsável pelos temas Regulação. Agências reguladoras. Serviço público e atividade econômica. Intervenção do Estado no domínio econômico. Autorização. 

Ministro do Superior Tribunal de Justiça desde 2008, Mauro Campbell é Presidente da Comissão de Juristas responsável pela elaboração de anteprojeto de reforma de Lei de Improbidade Administrativa ‒ instituída pela Câmara dos Deputados em 2018 – e da Comissão Permanente de Desburocratização da Administração Pública Brasileira do Senado Federal. O magistrado integra a Corte Especial, a 1ª Seção e a 2ª Turma do Tribunal, e também é Diretor da Revista do STJ. Campbell é autor e coordenador de diversas publicações, entre as quais o livro "Improbidade Administrativa - Temas Atuais e Controvertidos" (Forense, 2016).

 

1) Na sua opinião, qual é a importância da Jornada de Direito Administrativo no universo jurídico? 

Ministro Mauro Campbell ‒ O Direito Administrativo é, sem dúvida, uma das áreas mais significativas do Direito contemporâneo. Como ramo do Direito que regula a administração pública ‒ sua organização, seus serviços e suas relações com os cidadãos ‒, está apto a registrar comandos normativos para realização dos fins públicos, garantindo uma melhor eficiência na regulação jurídica do poder administrativo do Estado.

Dentre as mais diversas definições doutrinárias, costumo ressaltar as breves palavras da mestra Maria Sylvia Zanella Di Pietro. Segundo ela, esse é o ramo do Direito que regula a "atividade jurídica não contenciosa do Estado" e aqui, completo, com vistas, sobretudo, a garantir a supremacia do interesse público, estabelece ferramentas aptas a gerir, dentre outros, os limites de atuação do administrador público, as formas de gestão dos bens públicos, a responsabilidade administrativa do Estado, as compras e os serviços no âmbito administrativo e a regulação dos serviços públicos. 

Se, de um lado, há uma complexidade de regras e normas que compõem o Direito Administrativo, o que, por si só, é capaz de ensejar inúmeros questionamentos judiciais quanto às atividades estatais; o fato é que, de outro, o sistema de checks and balances impõem ao Judiciário o respeito à atividade tipicamente administrativa discricionária de outro Poder. Esses dois pontos, antagônicos em sua essência, muitas vezes levam a um impasse na solução judicial de questões de alta indagação jurídica. Nesse contexto, um palco de debates sem limites condicionantes, in casu, as Jornadas de Direito Administrativo, pode, a meu sentir, permear o encontro de soluções que melhor atendem a coletividade. 

2) Quais são os resultados práticos esperados desse evento? 

Ministro Mauro Campbell - Para esse evento, espera-se discutir temas que não encontraram, no cenário atual, um consenso interpretativo minimamente convincente. Espera-se que, por meio das proposições a serem debatidas nas plenárias, temas relevantes para o seguimento possam ser discutidos entre participantes das mais diversas áreas do Direito que estiverem representadas. Após cada qual contribuir com sua área de expertise e chegar-se, ao fim, a uma proposição aprovada; o produto final desejável é que cada proposição sintetize uma melhor forma de pensar os problemas atuais e os vindouros para as questões ali positivadas. Por certo, muitas delas, se não já estiverem judicializadas, em algum momento estarão. Assim, não é demais esperar que o fruto desse trabalho seja capaz de trazer luzes às Cortes Superiores, sobretudo ao Superior Tribunal de Justiça, na formação de sua jurisprudência. 

3) Em sua análise, é possível conferir efetividade aos enunciados para a melhor aplicação do Direito Administrativo?

 Ministro Mauro Campbell - Desde que a redação esteja clara, com a escorreita exposição da problemática que lhe antecedeu, acho muito possível conferir efetividade às proposições. Claro que temas extremamente técnicos, os quais exigem um exame detalhado de um elevado número de legislações, indicando que ao interprete é dado o uso da interpretação sistêmica para se chegar a um resultado aceitável, não encontrarão, nessa metodologia reduzida de definição de pensamento jurídico, a melhor forma de demonstrar raciocínio. Contudo, entendo não ser esse ponto motivo de preocupação, tampouco capaz de minimizar os aspectos positivos do método.