Justiça Federal inicia projeto piloto do AGROJEF no interior de Mato Grosso
Em cerca de 15 minutos, centenas de moradores do remoto município de Ipiranga do Norte, em Mato Grosso, deram o primeiro passo rumo à solução de problemas agrários, ambientais e previdenciários que se arrastavam por anos. Nesta terça e quarta-feira, dias 31 de julho e primeiro de agosto, a Justiça Federal deslocou-se à região, a 480 km da capital Cuiabá, para dar início à fase de atermação do projeto piloto do AGROJEF: uma iniciativa inédita voltada à regularização previdenciária e agrária de assentados rurais do Incra, no âmbito dos Juizados Especiais Federais (JEFs).
Os dois dias de trabalho resultaram em mais de 150 atendimentos e cerca de 120 atermações (números parciais), realizadas no ginásio municipal de Ipiranga do Norte. Foi a oportunidade, para dezenas de jurisdicionados, de ter o primeiro contato com a Justiça Federal e a possibilidade de ingressar com ações judiciais em causas de pequeno valor. “É um olhar do estado para eles. A gente percebe que eles têm pouca informação sobre o funcionamento da regularização de uma área rural”, afirmou a diretora da Subseção Judiciária de Diamantino/MT, juíza federal Vanessa Curti Perenha Gasques, responsável pela idealização e coordenação do AGROJEF.
Nos últimos meses, a magistrada envidou esforços e costurou parcerias que tornaram possível a concretização do projeto. Aproveitou-se do JEF itinerante, em curso no município de Nova Mutum, a 260 km de Cuiabá, para “estender” a ação até a região mais ao norte do estado. Para tanto, contou com a participação de três servidores da subseção de Diamantino, de dois oficiais de justiça de Cuiabá e dois peritos do INSS, além de uma força tarefa composta pelo Incra, Ibama, Exército e Polícia Federal. Também obteve apoio da Empresa Mato-grossense de Pesquisa, Assistência e Extensão Rural (Empaer), da Secretaria de Agricultura e Meio Ambiente e da Prefeitura de Ipiranga do Norte. “É um projeto muito bem elaborado [...] e fundamental para o município, que foi criado, essencialmente, de assentamentos da reforma agrária”, declarou o prefeito Orlei José Grasseli.
O AGROJEF desloca-se, nesta quinta-feira, dia 2, para a região de Tapurá, segundo município atendido pelo projeto piloto, onde conclui a fase de atermação. Das últimas 48 horas, as equipes distribuídas em sete veículos levam a lembrança de personagens e histórias da vida sofrida no campo, que agora figuram em processos judiciais. É o caso da dona de casa Vilma de Souza, 46 anos. Ela protocolou hoje a ação na Justiça Federal, na esperança de conseguir um dos 44 lotes do assentamento Santa Irene, a 40 km de Ipiranga do Norte. Lá, pretende plantar e garantir o sustento da família. Casada e mãe de três filhos, dona Vilma morou a vida toda na região de Ipiranga do Norte, e acompanha a labuta diária do marido na extração de raízes que impedem o plantio da soja, principal motor da economia local.
Nas pernas, movimentadas com a ajuda de muletas, a dona de casa leva marcas de décadas de trabalho árduo na extração de látex das seringueiras, que resultaram em sérios problemas motores e um desvio na coluna. Sobrevive com os cerca de R$ 700 por mês do trabalho na lavoura. Após fazer a atermação, a juíza federal Vanessa Curti e um servidor do Incra foram ao local e constataram: a terra que a família pleiteia, ao lado do lote que ocupam há três anos, está improdutiva. Por isso, o atual proprietário pode perder o direito à reforma agrária. “Meu sonho é ter uma terra para eu morar com meus filhos. Já sofri demais em terra dos outros”, desabafou Vilma.
O processo da dona de casa e todos os demais atermados em Ipiranga do Norte e que serão formulados em Tapurá (Tapurah), serão alvo da terceira fase do AGROJEF, a de audiências, marcada para ocorrer entre os dias 24 e 28 de setembro.
Os dois municípios foram escolhidos como ponto de partida do projeto devido à grande concentração de assentamentos rurais – sete apenas em Ipiranga do Norte, com 598 famílias assentadas –, e à proximidade com a Subseção Judiciária de Diamantino. A expectativa da coordenadora do AGROJEF é que a ideia seja difundida em toda a Primeira Região e, posteriormente, nas demais regiões da Justiça Federal. “São demandas próprias do interior e que precisam ser vistas com mais atenção pelo Judiciário”, finalizou Vanessa Curti.
Fonte: TRF1