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Justiça Federal condena União e motorista por morte de estudantes eletrocutados

publicado 04/10/2012 18h45, última modificação 11/06/2015 17h12

O juiz substituto da 8ª Vara Federal, Aloysio Cavalcanti Lima – Subseção Judiciária de Arapiraca – condenou a União e um motorista de caminhão-pipa, solidariamente, ao pagamento de R$ 120.000,00 de idenização por danos morais, cabendo a cada demandante um terço do valor arbitrado, corrigido monetariamente, e juros de mora em decorrência de responsabilidade civil por morte em acidente de trânsito ocorrido entre um ônibus escolar, que fazia transporte de estudantes da rede pública estadual de ensino, e um caminhão-pipa, de propriedade particular, a serviço do Exército Brasileiro, em janeiro de 2011.

Os autores, viúvo e genitores de G. R. N. S., relatam que em 27/01/2011, a jovem G. R. N. S  de apenas 19 anos era transportada em ônibus escolar que prestava serviço à Secretaria Estadual de Educação, quando o caminhão pipa conduzido pelo réu trafegava em sentido contrário ao ônibus escolar,  chocando-se com um poste de luz, derrubando fios de alta tensão sobre o ônibus escolar. Apavorados, alunos desceram, forçaram a porta do ônibus escolar para descer do veículo, quando seis foram eletrocutados e mortos.

A ação ordinária, com pedido de liminar foi proposta por familiares da estudante morta e outros contra a União Federal, o Estado de Alagoas e o motorista. A liminar foi deferida para se determinar a indisponibilidade do veículo de propriedade do condutor, garantindo-se eventual indenização. O Estado de Alagoas não sofreu efeitos da sentença.

Em relação à União, o magistrado federal entende que a responsabilidade civil da Administração Pública por atos comissivos, como os fatos em julgamento, tem previsão no § 6°, do art. 37 da Constituição Federal: “As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa”.

“A União, por intermédio do Comando do Exército – 59º Batalhão de Infantária Motorizado – contratou os serviços de transporte e distribuição de água potável através de caminhão-pipa para os habitantes do Município de Girau do Ponciano-AL. Dentre os encargos do ente federal, era de sua responsabilidade providenciar os recursos para o pagamento dos serviços e supervisionar o contratado, designando equipes para tanto (cf. cláusulas primeira e terceira do contrato de fls. 96/103)”, ressalta Aloysio Cavalcanti na sentença.

Atividade estatal

Segundo ele, ao socorrer os habitantes afligidos pela estiagem no interior alagoano, a União exerce típica atividade estatal. “De modo algum merece guarida o argumento defensivo no sentido de que se estabeleceu entre o Estado e o proprietário do veículo de transporte típico contrato de concessão de serviço público, de modo que sobre prestador de serviço (concessionário) recaísse a responsabilidade primária pelos fatos do serviço, isentando-se a Administração Pública”.

O magistrado federal registra que os serviços de caminhão-pipa tinham a brevíssima duração de 29 dias, sob o regime de inexigibilidade de licitação. O fornecimento de água aos habitantes prejudicados pela seca não se encontra em regime de monopólio, como os serviços postais e de energia elétrica. A atividade justificava-se enquanto perdurasse a situação de calamidade. Daí porque sequer foi possível estabelecer concorrência entre particulares; o contratado não passou por qualquer crivo de aptidão técnica. Fez-se presente e contratado foi.

“O negócio firmado entre o Poder Público e o particular tratou-se de simples contrato emergencial, temporário e precário, fora do enquadramento da Lei n. 8.987/95. Com efeito, embora seja corresponsável pelo sinistro, o dono do caminhão-pipa não assumiu integralmente, por sua conta e risco, a responsabilidade por suas atividades, até porque o contrato entabulado previa a supervisão e fiscalização do Comando do Exército. Disso se conclui que a União, por meio de prestador de serviços, incorreu em conduta comissiva, atraindo os efeitos do § 6º, do art. 37, da Constituição Federal, sendo desnecessário perquirir-se dolo ou culpa no comportamento lesivo”afirma o juiz.

A forma como o acidente aconteceu indica, de acordo com Aloysio Cavalcanti, “clara responsabilidade da União. O encadeamento dos eventos demonstra que foi a incúria do motorista do caminhão pipa o elemento responsável pelas mortes dos passageiros do ônibus escolar. Foi pelo choque do caminhão no poste que os fios de alta tensão precipitaram-se sobre o ônibus, energizando suas portas e matando os alunos. De acordo com a teoria do risco administrativo, a União assume a responsabilidade pelos perigos decorrentes da atividade que contratou”.

O laudo de exame cadavérico juntado concluiu que a mulher e filha dos autores faleceu por “parada cárdio-respiratória consequente a choque elétrico”. O dano moral é inerente ao falecimento do familiar dos autores. G. R. N. S tinha 19 anos de idade. “Há apenas poucos anos casada, teve ceifada a oportunidade de gerar filhos e de desenvolver-se profissionalmente já que era estudante. Em tenra idade faleceu e enlutou o marido e os pais. Inquestionáveis a dor, a saudade, as lembranças e o luto. O abalo psíquico dos autores se agrava diante das trágicas circunstâncias do acidente, conforme se visualiza das fotografias dos cadáveres anexadas aos autos” (fls. 39/47).

O fato, segundo o juiz federal, excedeu em muito o sentido de mero aborrecimento e marcou profundamente a vida dos demandantes. A indenização pugnada, portanto, é devida, na linha do entendimento dos tribunais. Em relação ao motorista e réu, o juiz entendeu que sua responsabilidade é subjetiva. “O risco administrativo recai sobre o ente público; o preposto somente responde a título de dolo ou culpa, consoante inteligência da parte final do § 6º, do art. 37 da Constituição Federal”.

Assim, conclui pela inexistência de dolo. “Não há notícias de que deliberadamente o motorista do caminhão tenha investido contra o poste de eletricidade para atentar contra a vida dos usuários do ônibus escolar. A conduta, destarte, foi culposa, nos termos do art. 186 do Código Civil”, afirma Aloysio Cavalcanti. Na sentença, reconhece negligência e desatenção do motorista ao acidentalmente lançar o veículo contra o poste de eletricidade, causando a morte de seis estudantes, dentre eles,  G. R. N. S.

A indenização postulada consiste em compensação pelos prejuízos sofridos pelos autores. Seu arbitramento exige a ponderação entre a dor, o sofrimento, o luto dos familiares da vítima e o efeito pedagógico imposto aos causadores do dano, bem como o poderio financeiro dos mesmos.

Fonte: Ascom - JFAL