Segurado do INSS deve devolver valores recebidos por antecipação de tutela posteriormente revogada
É dever do titular de direito patrimonial devolver
valores recebidos por força de tutela antecipada posteriormente
revogada. O entendimento foi da Primeira Seção do Superior Tribunal de
Justiça (STJ), ao julgar o recurso do Instituto Nacional do Seguro
Social (INSS) contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região
(TRF4).
No caso julgado, um pai pleiteou pensão por morte do filho.
Os pagamentos foram efetuados por força de decisão judicial que concedeu
antecipação de tutela. Ao final do processo, ficou decidido que ele não
tinha direito ao benefício e o INSS buscou a devolução dos valores
pagos.
O TRF4 decidiu que os benefícios previdenciários, se
percebidos de boa-fé, não estão sujeitos à devolução. Mas para o relator
do recurso, ministro Herman Benjamin, a decisão que antecipa
liminarmente a tutela não enseja a presunção, pelo segurado, de que os
valores recebidos integram em definitivo o seu patrimônio. Tal garantia é
dada pelo artigo 273 do CPC.
Para ele, “não há legitimidade
jurídica para que o segurado presuma o contrário, até porque
invariavelmente está o jurisdicionado assistido por advogado e, ninguém
se escusa de cumprir a lei, alegando que não a conhece”.
A decisão
da Seção foi por maioria de votos, pois há divergências jurisprudenciais
na Corte sobre a obrigação da devolução desses benefícios de caráter
alimentar, além de posições antagônicas aplicadas a servidores públicos e
a segurados do Regime Geral de Previdência Social. Pra aprofundar o
debate, o ministro Herman Benjamim apresentou diversos precedentes do
próprio STJ nos dois sentidos.
Divergência no STJ
No Recurso
Especial 674.181, da relatoria do ministro Gilson Dipp, a tese defendida
foi a do não cabimento da devolução. “Uma vez reconhecia a natureza
alimentar dos benefícios previdenciários, descabida é a restituição
requerida pela autarquia, em razão do princípio da irrepetibilidade dos
alimentos”.
Na mesma linha do anterior, Benjamim mencionou o REsp
1.341.308, da relatoria do ministro Castro Meira. Para ele, “os valores
recebidos pelos administrados em virtude de erro da Administração ou
interpretação errônea da legislação não devem ser restituídos,
porquanto, nesses casos, cria-se uma falsa expectativa nos servidores,
que recebem os valores com a convicção de que são legais e definitivos,
não configurando má-fé na incorporação desses valores”.
No REsp
639.544, a relatora Alderita Ramos declarou que “a jurisprudência dessa
Corte firmou orientação no sentido de que os valores indevidamente pagos
por força de decisão judicial liminar posteriormente revogada são
passíveis de devolução, sob pena de enriquecimento ilícito por parte dos
servidores beneficiados”.
Em outro precedente, o ministro Gilson
Dipp entendeu que “é obrigatória a devolução por servidor público de
vantagem patrimonial paga pelo erário, em face de cumprimento de decisão
judicial precária, desde que observados os princípios do contraditório e
da ampla defesa” (REsp 1.177.349).
No REsp 988.171, o ministro
Napoleão Nunes Maia Filho elucidou a questão da seguinte forma: “embora
possibilite a fruição imediata do direito material, a tutela não perde a
sua característica de provimento provisório e precário, daí porque a
sua futura revogação acarreta a restituição dos valores recebidos em
decorrência dela”.
Irrepetibilidade dos alimentos
De acordo
com Benjamin, a teoria da irrepetibilidade dos alimentos não é
suficiente para fundamentar a não devolução dos valores indevidamente
recebidos. A fundamentação depende ainda da caracterização da boa-fé e
do exame sobre a definitividade ou precariedade da decisão judicial.
“Não
é suficiente, pois, que a verba seja alimentar, mas que o titular do
direito o tenha recebido com boa-fé objetiva, que consiste na presunção
da definitividade do pagamento”, declarou Benjamin.
Precariedade
Benjamim
também mencionou o REsp 1.263.480, da relatoria do ministro Humberto
Martins. Para Martins, a boa-fé do servidor é a legítima confiança de
que os valores recebidos são legais e integram em definitivo seu
patrimônio. “É por esse motivo que, segundo esta Corte Superior, os
valores recebidos indevidamente, em razão de erro cometido pela
Administração Pública ou em decorrência de decisão judicial transitada
em julgado e posteriormente reformada em ação rescisória, não devem ser
restituídos ao erário”, afirmou.
Martins observou que, diferente da
situação anterior, o servidor deve restituir o erário quando os valores
são pagos em consequência de decisão judicial de característica precária
ou não definitiva. “Aqui não há presunção de definitividade e, se houve
confiança neste sentido, esta não era legítima, ou seja, não era
amparada pelo direito”, ponderou.
Benjamin explicou que a decisão
cassada nos casos de antecipação de tutela em ações revisionais ou
concessórias previdenciárias é precária. Nas ações rescisórias, a
decisão cassada é definitiva.
Critérios de ressarcimento
Ao
decidir que os segurados devem devolver os valores recebidos em virtude
de decisão precária, a Primeira Seção lembrou que o princípio da
dignidade da pessoa humana tem o objetivo de garantir um contexto
adequado à subsistência do indivíduo.
Para isso, de acordo com o
colegiado, existem alguns dispositivos legais que demonstram o
percentual da remuneração a ser comprometido, para não prejudicar o
sustento do segurado.
Benjamim explica que os descontos sobre os
benefícios previdenciários são estipulados pelo artigo 115 da Lei
8.213/91, alterado pela Lei 10.820. De acordo com a lei, esses descontos
se dão no limite de 30% sobre o benefício previdenciário.
O
ministro observa que o percentual mínimo de desconto aplicável aos
servidores públicos, contido no artigo 46, parágrafo primeiro, da Lei
8.112/90 é de dez por cento. Assim, conforme o dispositivo, o valor de
cada parcela para reposição do erário não poderá ser inferior ao
correspondente a dez por cento da remuneração, provento, ou pensão.
Dessa
forma, a Primeira Seção decidiu que, no processo de devolução dos
valores recebidos pelo segurado por força de antecipação de tutela
posteriormente revogada, o INSS poderá fazer o desconto em folha de até
dez por cento da remuneração dos benefícios previdenciários recebidos
pelo segurado, até a satisfação do crédito.
Fonte: STJ